De tanto andar pelos cantos da Serra, o Viandante, foi pego pelo conhecimento de seus feitos mesmo que quisesse o anonimato, ás vezes algo maior e sem nossa compreensão terrena, nos fazem de peças chaves para um joguete desconhecido e de momento ás nossas turvas mentes mortais, algo impossível de entender...
Nossa história de hoje começa, quando o Viandante aparece em um entreposto para trocar as peles e cestos que fez no decorrer de sua vida eremita na mata, por alimento metal e roupas, afinal ainda haveria dentro de si sempre um pouco de humanidade, civilidade, por assim dizer.
Então pelo seu olhar frio,seu silêncio perturbador e sua postura, o mini mercado que estava cheio por um momento silencia ao contemplar a sua presença, e por breve tempo de interlúdio um homem, com vestes mendicantes troca olhar com o Viandante...Nesse momento sutil palavras não serão mais necessárias...O homem precisava de sua ajuda e ele sabia do fundo de sua alma que não poderia recusar. Então com um aceno de cabeça, dando seu consentimento o homem o segue,até uma taverna pouco frequentada e se assentam sempre de encontro a parede, para evitarem ouvidos curiosos, e mal faladores, das coisas que ouvem pela metade e de outra metade inventam as infâmias do mundo, que descarnam a moral dos mais justos.
- Fale, homem, conte sua história,para ver onde possa te ajudar, se é que realmente o possa fazer...!
Em resposta as palavras do Viandante, com uma voz baixa e um tanto sofrida, o homem começa a contar a sua história...
- Meu nome é Pedro Liz, a tempos não muito distante você não me reconheceria pois não vestia esses trapos, eu era um bom comerciante de mercadorias e com minha carroça e cavalos supria até mesmo mercadinhos distantes com esse daqui...Então nada me faltava, nem a mim, a minha esposa amada e meu pequenino filho, que estava nessa terra do Divino não mais que um ano. Nossa casa era a das mais altivas, e meus empregados, as mantinha sempre linda e limpa.
- Contudo - complementava a fala, o homem, e chegando ao ponto mais sofrido do relato sua voz é apertada dentro de sua garganta, tentando trava-la, para não tocar na ferida ainda aberta, dentro de sua alma partida, mas com coragem e necessidade urgente, prosseguiu - Bem, eu não poderia ter nenhum assistente,pois temia de mostrar a minha rota e meus contatos no comércio, era por isso que me dei bem, mantendo alguns secretos da profissão para mim e mais ninguém...Contudo, como dizia, isso acarreta em viagens constantes e cada vez mais distantes, muito cansativas.
Minha mulher dizia para que ficasse mais tempo em casa, já não éramos mais jovens e somente com um filho deveria aproveitar mais o seu crescimento, vivendo mais dentro de casa, do que viajando...Ah! Se eu tivesse ouvido lábios tão sábios e sagrados! Mas em minha busca por sempre mais, o maldito dinheiro, não me ative as suas palavras e continuei minha busca cada vez maior por clientela e ouro...
- Lembro como se fosse ontem.Estava tão cansado das viagens que começava a dormir dirigindo aquela maldita carroça;quando chegava em casa, como sonâmbulo tomava u banho e ia dormir, para em seguida sair mais uma vez, e de novo...E de novo. E foi assim que em um dado momento, meu filho sabendo que chegaria fugiu às escondidas de sua mãe e foi me esperar fora de casa sozinho, par me fazer decerto uma surpresa...Foi nesse dia maldito que sonolento eu o matei , passando por cima dele com minha carroça e cavalos!
Houve silencio do homem, e um grito foi travado a meio caminho de sua boca, seus dentes travados pela dor engasgaram, sufocaram o grito de tal forma que cortaram os lábios de sua boca, escorrendo deles um filete de sangue...
- Dali dessa desgraça tudo deu errado para mim...Minha mulher que o Divino a tenha, em seguida a um tempo, sem condições de viver sem nosso filho, se enforcou dentro da mata em uma árvore....De tamanho que era seu desgosto pela vida. Minha dor foi tanta que pedi aos céus para que me levassem também daqui desse mundo! E não sendo atendido, minha raiva foi tanta que matei todos os meus cavalos e queimei minha bela casa e a carroça. Me larguei nesse mundo espinhento vivendo de andarilho...Mas para meu pesar não fui sozinho. A cada noite que se achega e eu faço uma fogueira para me aquecer no relento, aparece uma bruxa, trazendo acorrentados pelo pescoço como bichos de cargas, o meu filho e minha mulher, arrastando os fazem se assentar na fogueira, que se queimam e sarapicados pelo fogo, sentam-se ao lado oposto do meu , ao lado da maldita bruxa, mas nada dizem, pois ela costurou, suas bocas para não falarem comigo...E a dor fica mais insuportável, pois eles falam com seus olhos sofridos, com suas santas lágrimas que escorrem dos dois olhos de cada um, e quando não aguento a visão dantesca, salto na bruxa e tento esgana-la e ela só abre aqueles malditos olhos negros e ri, gargalhando muito e numa nuvem de fumaça some...Maldita! Maldita!
Mais uma vez a dor o consome e sem controle ele soca a mesa da taverna, tão forte que ela geme compartilhando a dor dos punhos amassados co seu causador..Sob o olhar preocupado do taverneiro, o Viandante pede uma bebida forte para acalmar a dor do coração de seu confessor, e após um longo e profundo trago de ambos, ele começa a falar...
- O mal não tem porta, nem fronteira que não se achegue, homem. Quando fazemos uma maldade e não encontramos o perdão dentro de nós, pedimos para sofrer, achando que isso vai pagar o pecado que fizemos, ou que achamos que fizemos...Mas quem somos nós para entendermos as mazelas do destino, ou da própria morte? Quando fazemos mal a alguém, e ele não nos perdoa, essa pessoa pode nos amaldiçoar e pelos erros, nos ligamos ao mal e o mal vem nos atormentar, pois somos devedores, pessoas boas, honestas, sinceras e amáveis, o mal não tem poder nenhum...Somente as devedoras, cruéis, vingativas, invejosas, negativistas,pecadoras, essas o mal vem, aflinge, como parte de sua penitência de saldar suas dividas com aqueles que causou. Contudo a maior e mais cruel maldição vem quando nós mesmos nos amaldiçoamos, seja por infortúnio como os teus, ou erros imaginários de uma mente sofrida e doente...Com essa maldição você não sofre sozinho, você traz sempre algum espírito amado dos seus que sofre junto a você, inocentes de tudo, pois você é que causou isso...
O homem se cala, e lágrimas rolam como rios de seus olhos...Durante todo esse tempo ele havia arrastado dentro de sua auto culpa os espíritos de sua mulher e filho..Ambos sofreram aos seu lado, sem necessidade só porque no fundo o amavam? Deus do Divino, me perdoa! eram seus maiores pensamentos naquele momento. O Viandante continua..
- Mesmo quando após saírem sem culpa ou mágoa desse mundo, e ao visitarmos o túmulo de nossos entes queridos, e os clamamos, dizendo que sentimos sua falta e que seria bom que sempre tivéssemos eles do nosso lado, mesmo ali nós os acorrentamos a nossa dor medíocre e as velhas senhoras dos fios das vidas, as Moiras, nos trazem eles, acorrentados seguindo a nossa vontade e aos nossos dias, sofrendo sem necessidade, do nosso lado, quando poderíamos tão somente proferir as palavras do Monge sagrado, e liberta-los: EU OS AMO, ENTÃO VAYAM CON DIOS!
Sim, homem, eu mato os monstros eu liberto o mal, mas como lhe disse haverão coisas que estarão longe de poder faze-los, pois competem somente a ti pois são teus e não meus, nem deles o pecado de auto culpar-se, então se perdoa, se liberta e liberta eles também, e segue seu caminho deixando que os mortos sejam enterrados pelos mortos! Termina a bebida que é por minha conta!
O Viandante se levanta da mesa e toca forte no ombro do homem, se despedindo e seguindo seu caminho...
Mais uma noite chega, e ao fazer a fogueira eles aparecem e como sempre se assentam noutro lado do fogo, dessa vez e sem raiva o homem se achega também doutro lado e senta ao lado da Moira, abraça-a e com um beijo na testa lhe pede perdão pedindo que os liberte, pois ele compreendeu e também se perdoou...A Moira chora, lágrimas negras de seus olhos negros e abraça bem forte o homem, disparando um largo sorriso...Ela tira as correntes desata os lábios deles e como uma mãe bondosa, com tapas carinhosos em suas bundinhas, diz:
- Vocês já o viram, agora vão para casa, vão, vão!
E com um sopro de vento, a Moira também se vai...Ao amanhecer o homem renovado recolhe seus pertences, e segue de volta ao antigo lar, pelas estradas da Tradição,pois tem uma vida inteira para recomeçar e seguir em frente, como todo o Serrano faz, sacudindo a poeira, se levantando e vivendo!
sexta-feira, 13 de maio de 2016
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