quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

A CRUZ DO ESTRADÃO

      Foram intermináveis os momentos de de  auguria desse rastro perdido...Por entre as flores , espinhos e gramas....Sob as sombras das árvores, e no escaldo do sol, então o encontrei, mais um conto do monge...
      era um mês de calor escaldante, aquele mês de Fevereiro, sem sombra de dúvidas era o mais quente, que se via nos últimos anos...Os caminhantes da Estradas antigas da Tradição, se abanavam ou se escondiam sobre seus guarda chuvas,e por que não os chama-los então de guarda-sóis? Em meio ao infernal calor da manha, e em sua passividade anacrônica vinha o monge Mooshradoom, apreciando as ondas de calores que se formavam no largo da estrada que mais pareciam reflexos de um rio fantasma, uma ilusão amargurada ao calor que se fazia.
      Próximo da estrada, sentado a beira do caminho, ao lado de uma velha cruz feita de pau a pique estava um velho senhor, também cozido pelo calor, nos reclames e entreolhando as pessoas que o passavam sem, ao menos lhe direcionarem o olhar...Talvez por ser negro de nascimento,ou por seus cabelos e barba tão brancas que denunciavam a sua velhice e por aí falta de sandice...Talvez.
O monge se aproxima na maior da inocência e senta ao largo junto a cruz de pau a pique, junto ao velho homem e lhe pergunta:
       - Qual seu problema? Por que não anda mais e vida nesse calor?
       - É essa minha idade...Ninguém mais se importa ou tem respeito, quando uma pessoa vive muito           mais do que devia,não é mesmo? - respondeu com certa graça o velho idoso..
       - Mas, e essa cruz? Também faz parte desse pacote?
       - Pois sabe que é mesmo! Eu tenho de minhas crendices e essa minha santa cruz vem pra pagar            uma promessa a minha padroeira negra, pela graça  que tenho de alcançar, de curar a minha                 mulher e meu filho, que ficaram doentes e não tenho dote nenhum pra pagar os remédios quem           dirá  um hospital de médico...
       - Então na sua crença, na padroeira negra, ela os fará, ficarem juntos de novo se o senhor                        carregar essa cruz...Mas carregar pra onde?- perguntou o monge com sua curiosidade de                       sempre.
       - Oras, essa também é fácil de responder!  Estou a muito andando, vim dos inicias do Cafundó e         agora que me faltam poucas léguas, que devo chegar na capelinha de minha padroeira negra, me         vem esse maldito calor e me tira do sério, homem do céu! Não tenho mais forças,e ninguém para          pra me ajudar por mais que eu peça...Ninguém se importa com as sandices de um velho, isso               não...!
      Com o sol quente o monge se levanta, olha para todos que passam e quando os encara eles abaixamo olhar, de modo desconfiado, ninguém quer se envolver...Esse é o mundo de hoje apático e sem sentimentos, a não ser com os quais possam ter lucros, posição ou reconhecimento por algum simples ato humano...
        - Olha não sei muito não dessa sua padroeira,mas achei válida a sua solicitação, bom e velho                homem...Vou te ajudar, com uma boa mão amiga, que todos devíamos ter...
        - Mas como homem de Deus? Tô tão cansado nesse calor que meus joelhos não me sustentam             mesmo que quisesse me levantar, não poderia....Se não chegar então a capelinha que sera dos                meus?
        - Calma que pra tudo tem jeito, me espera aqui que ja me retorno, viu?
      O monge saiu a procura de uma casa mais próxima e lá encontrou um campesino, contou a história da cruz,ao largo da estrada e do homem ao lado dela...Mesmo emocionado o campesino anda um tanto descrente, lhe pergunta:
       - Monge, não duvido de sua história, mas andar mais de uma légua empurrando o carrinho com          "ele" assentado dentro, e com essa CRUIZONA nas costas, o monge acha certo? Bem se acha,              quem sou eu pra não ajudar...Pode levar meu carrinho de mão e as cordas que precisar pra se               amarra naquela cruz...
     E assim o monge fez, levou o carrinho de mão do campesino emprestado e colocou o idoso dentro dele; e se amarrou a grande cruz,e pôs-se a viagem insólita em meio aquela alta temperatura, sem perder tempo esperando alguma sombra aparecer, pois faltava pouco para aquele homem velho encontrar a solução de seus pedidos, que era estar de novo junto de sua família.
A cada passo que dava no caminho muitos paravam para olhar e uns até se benziam, mas ajudar que era bom nada...E aquela jornada mostrou ao monge a verdadeira essência dos homens em apenas julgarem pela aparências e não pelo que realmente estaria ocorrendo, mas também lhe ensinou a não ser pego pelos ouvidos das falas dos outros, no final o que manda é seu coração e ele não tem ouvidos, é surdo.
       Como sempre os últimos momentos eram os mais difíceis, muitos acompanhavam, no fundo curiosos para ver o final dessa história um tanto estranha, até...O idoso parecia contente em estar finalmente chegando até a capelinha de sua padroeira para cumprir a promessa que fizera a tempos atrás, afinal fora uma longa e interminável jornada até aqui...
Quando finalmente chegaram ao local, Mooshradoom, descansou o carinho  e retirou a cruz em uma movimento calmo e caiu ao solo quase desmaiado pelo tremendo esforço...Tomou fôlego e se recompôs. Colocou o velho homem de frente pra capelinha, ainda assentado no carrinho de mão, e ao lado da capela, colocou a cruz da promessa, e colocando a mão em seu ombro, daquele velho senhor, o ombro marcado pro profundas feridas, que testemunharam o esforço da fé daquele homem em nome de sua sagrada família, a qual amava mais que a própria vida, a ponto de coloca-la em propósito firme, que o levara a essa promessa e lhe falou:
      - Pronto meu velho, finalmente chegamos, a capela de sua padroeira negra, e agora?
      - Homem do Céu, estou sem forças ainda, pode então rezar por mim e minha família, pra que                 possamos  passar por mais essa e nos juntarmos mais uma vez?- pediu o velho homem com os            olhos molhados de lágrimas, que escorriam, pingando no chão seco, que as tomava, com                      esperança de matar também a sua sede, nesse forte calor.
     O monge em sinal humildemente aceita o pedido e se ajoelha na frente da capela e começa a rezar a ladainha sagrada, e aquele momento sagrado foi tal que todos quebraram seus corações e rezaram juntos a Ave Maria...
O monge então vê duas pessoas se aproximando de meio á  sombra da capelinha, eram a mulher e o filho, daquele idoso homem, que lhe tomaram nos braços e saíram andando felizes até a sombra da capelinha onde desapareceram, como todas as lendas da nossa Serra...E então choveu como muito não havia chovido naquele lugar, realmente fora um mês muito estranho, esse tal Fevereiro...


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