quinta-feira, 12 de março de 2015
ENTENDENDO A SERRA: O CORPO SECO
Certas tradições e regras se definem não de um momento estático no tempo, mas de vários relatos e comportamentos, que conforme o resultado diferente de muita teoria nos dão os procedimentos práticos daquela natureza de como agir e se portar.
Pois bem, na serra se entende por CORPO SECO, aquela criatura tão desumana em algum sentido bíblico, por algum ato contra o ato Divino, que nesse momento nem o céu, inferno ou purgatório o aceita, fazendo com que tal criatura perambule sem destino, ou em algumas vezes com objetivo próprio, para que pague por penitência, seus horrendos crimes acometidos em vida, até que o fim dos tempos se achegue a todos nós, vivos ou mortos, homens ou não...
Geralmente, por medo de mais sofrimento nas mãos dos vivos, eles saem a noite para andarem, procurarem, ou cumprir suas penitências e maldições, pois a aparência de um corpo morto geralmente, de pele e osso, não ajuda em nada , o alívio de seu sofrer.
Dito isso só pra esclarecer volto as minhas memórias de onde desencanto a história de um dado momento em que passava por trilhas entre paredões sombrios onde a luz do sol puco se achegava e lá encontro em meio a passagem um corpo caído... Cauteloso por receio de emboscadas desço de arma fora da bainha, e atento, pois em terra de estranhos devemos andar como quem anda por entre um rio turvo, de onde nunca se pode ver o fundo...Pisando a cada passo com extremo cuidado, para não se afundar nem mesmo se atolar, pois ambos sozinho, são caminhos sem volta.
Notei que o pobre vivente se encontrava todo cortado e lanhado de fios de arames farpados, mas o curioso é que em meio ao sangue e ferimentos, vi seus emblemas e era um viajante como eu e todos nós nesses caminhos do bom Deus...E qual o peregrino que não ajudaria a outro necessitado para que um dia assim o fizesse ao mesmo quando precisasse?
Armei acampamento e fiz uma fogueira para aquecer a água e cuidar de seus ferimentos, mesmo ele estando ainda desacordado. Em meio a limpeza de suas feridas, me perguntava que criatura tal de tamanha maldade faria isso, a um pobre vivente?
Então, após a manha se tornar tarde e depois noite, ainda aos gemidos o homem acorda pedindo o que beber e comer. Devido aos ferimentos e a perda de sangue, pouco se podia fazer senão dar tempo ao tempo, esperar pelo derradeiro, e aliviar sua passagem o quanto pudesse, como bom cristão... Ou senão apenas um simples homem o faria. Aos pucos e sabedor de seu próprio destino o homem com voz arqueada pela dor quer falar, e como bom ouvidor apenas escutei sua história, que repasso agora a vocês, nas palavras simples dele:
" Era nascido em um vilarejo pequeno, de uma família pobre mas trabalhadora do campo, e por longo tempo na infância fui um menino feliz..Meu pai trabalhava com afinco o campo, e nos dava o de comer e beber com o suor de seu trabalho e minha mãe cuidava bem de mim e dos afazeres de nossa humilde casa.Tudo ia bem até o momento que em certo dia,meu pai fez amizade com um estranho de fora vilarejo.O homem pouco ou nada tinha, somente as vestes do corpo e uma pequena bolsa de moedas de ouro, o que lhe interessou muito quando o estranho lhe mostrou, e disse que desejava criar parceria com o mesmo, para trabalharem junto nas terras do meu pai...Nossas terras.
Em meio a essa junção suspeita, meu inocente pai era seduzidos pelas palavras de doce veneno que o estranho lhe injetava a cada conversa, a cada palavra: Mas por que devo comprar mais terras? Perguntava meu velho pai ao estranho que lhe dizia: para termais posse e poder, homem!Pense no teu filho, em tua mulher, no bem estar deles, ora!
E assim com o tempo a ganancia tomou lugar a mansidão, e meu pai estava mais viajando a procura de terras e não ficava mais conosco...Nem me colocava para dormir. Mas o estranho se fez capataz e passou a comandar cada terra que meu pai trazia em escrituras e enquanto meu pai viajava quem mandava era ele...Foram dias e noites intermináveis tanto pra mim, quanto minha mãe, que num dos momentos de solidão foi também arrastada ás garras desse estranho, um lobo em forma de cordeiro.
Com o tempo tal pecado foi descoberto,e tudo ajeitada pelo estranho para que o fosse e meus pais se separam...Fiquei sem chão e meu mundo lindo que conheci ruíra de uma só vez em um instante.
Minha mãe levou metade de tudo que meu pai conseguiu e partiu par o mundo com o estranho.Ficamos sós, eu e meu pai, e com o passar do tempo tudo que era belo deu lugar ao horror a raiva e a dor...Meu pai se atirou na bebida perdendo tudo o que conseguira em maus empreendimentos.Onde tentei estudar e aprender algo, oque me ensinaram foi o preconceito de um povo contra uma mulher sem moral que abandonou seu lar e um pai bebum.Fui taxado de pária e com pedras e surras paguei pelos pecados de meus pais, sem ao menos merecer por isso!
Um dia mais crescido minhas veias explodiram em ódio e espanquei ferozmente um dos meninos que me boliam comigo.Então os pais dele falaram com meu pai que em desato de loucura me espancou de chicote deixando uma cicatriz enorme em meu rosto.E assim fiquei conhecido como o Cicatriz...E a cada chacota eu despejava minha ira e mais meu pai me espancava em um ciclo de inferno dantesco sem fim. Por fim já não podendo mais me conter com os espancamentos, ele me acorrentou anos em um sótão velho de nossa casa dizendo que uma fera raivosa devia ser acorrentada para não causar dano a ninguém, e quanto a isso meu ódio só crescia me levando a cada vez mais aos degraus da perdição.
Anos após meu ódio era tanto, que arrebentei as correntes e matei meu pai com o mesmo chicote, que me marcou...Daquela vila o que não pude matar coloquei fogo e destruí...Saí pelo mundo fazendo todo esse tipo de maldade.Tinha de cobrar em alguém tanta dor que passei.
Os anos se seguiram ainda mais e seja lá que for, de cima ou debaixo um dia me colocou em um bordel onde encontrei o estranho de dono e cafetão de minha mãe que virara prostituta quando o dinheiro que levaram de meu pai acabara! Sem palavras, de coração apertado, me veio a infância, as lembranças de suas mãos carinhosas nos fios de meus cabelos, quando cantava ninas para dormir...
Pensei comigo então, por um momento tudo podia parar ali mesmo, e quem sabe quase tudo poderia voltar ao normal.Sim, poderia volta a ser seu filho amado, poderíamos, ter um recomeço em um cantinho qualquer, e voltaria a ser feliz...!
Então em um momento emu olhar grande e brilhante encarou o seu e ela veio se aproximando, sentou do meu lado tocou meus cabelos, como a muito não o fazia,beijou-me a testa, pronunciando:
Como é bonitão, vai ser aqui ou em meu quarto?
Aquelas malditas palavras entraram com agulhas imensas em meu cérebro, tudo se escureceu e eu me tronei uma fera, mas muito mais selvagem que antes....Matei a todos, queimei a todos! Todos! Até o maldito estranho que como fera arranquei e comi seu coração ainda pulsante...
Então passando por entre esses paredões encontrei muitos corpos secos, que gritavam: está errado! Você é um de nós mas tem carne...Deixa irmão vamos te consertar!!! De momento eu lutei contra eles, como fera, derrubei muitos, mas me dominaram e usando arames farpados me arrancaram carne e músculos...Estou a quase osso e pele, assim como eles, que então lhe viram e partiram me deixando ao léu, sem salvação...
Sei que é meu fim, ser no final como ele, mas escuta irmão peregrino não me deixas morrer só, pelo menos isso. Me perdoa, em nome de meu pai, me perdoa em nome de minha mãe e de todos os outros, ficando essa ultima hora comigo...."
Ao término de sua história de vida, senti suas mãos segurarem firmes meus ombros e eu o abraço repousando sua cabeça e seus cabelos nos ombros...
Em meio ao fraquejar de suas mãos lágrimas rolam de meus olhos, enquanto lhe canto um nina para seu sono eterno,e pedi ao bom Deus, grande pai de todos, que no fundo perdoasse a todos o que fizeram com essa criança, tanto mal assim...
Enterrei esse viajante na beira da estrada com os dizeres que todos os viajantes tem direito no final:
VIAJA COM DEUS, AMIGO! E pedi ao Pai Celeste compaixão, por aquele que não ensinaram a amar, que seus dias de penitência sejam curtos, se for d aplicação de ato divino, que só a Deus caberá juízo e segui meu caminho.
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